SOCIAL SECURITY ANALYSIS CONCERNING THE PERCEPTION OF ILLNESS CARE FOR WOMEN VICTIMS OF DOMESTIC AND FAMILY VIOLENCE AND THE CIVIL LIABILITY OF AGGRESSORS
Andrieli Santos Conceição da Silva
RESUMO
A presente pesquisa tem por objetivo central analisar no âmbito previdenciário a percepção de auxílio doença às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar e a responsabilização civil dos agressores, pois com a alteração da Lei n. 8.213/91 a Previdência Social passou a ter legitimidade para ajuizar ação regressiva contra os responsáveis nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, além disso, tem se verificado decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça concedendo auxílio doença às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar, razão em que a violência física e psíquica é equipara à uma enfermidade. Para tanto, foi utilizado o método empírico indireto dedutivo fundado em análise jurisprudencial, legislação, doutrina e dados estatísticos, tendo como principais resultados a conclusão de que é dever do Estado assegurar a assistência jurídica e a manutenção do vínculo trabalhista à mulher, bem como, garantir os direitos fundamentais a fim de ampará-la, e por fim, a legitimidade do Instituto Nacional do Seguro Social para ingressar com ações de regresso em face dos agressores a fim de evitar o déficit na Previdência e responsabilizá-los civilmente.
Palavras-chave: Auxílio Doença. Decisões. Legitimidade. Violência.
ABSTRACT
The main objective of this research is to analyze, in the social security sphere, the perception of sickness benefit for women victims of domestic and family violence and the civil liability of aggressors, as with the amendment of Law no. 8.213/91, Social Security now has the legitimacy to file regressive action against those responsible in cases of domestic and family violence against women, in addition, there have been decisions handed down by the Superior Court of Justice granting sickness benefit to women victims of domestic violence and family, which is why physical and psychological violence is equated to an illness. To this end, the indirect deductive empirical method was used based on jurisprudential analysis, legislation, doctrine and statistical data, with the main results being the conclusion that it is the State’s duty to ensure legal assistance and the maintenance of the employment relationship for
women, as well as, guarantee fundamental rights in order to protect it, and finally, the legitimacy of the National Social Security Institute to take restitution actions against the aggressors in order to avoid the Social Security deficit and hold them civilly responsible.
Keywords: Decisions. Legitimacy. Sickness Benefit. Violence.
1 INTRODUÇÃO
O direito da seguridade social é gênero, cujo a saúde, previdência e assistência social são espécies, (Martins, 2023, p. 28) tendo como fundamento o conjunto de princípios, regras e instituições destinados a garantir a proteção social dos indivíduos, a fim de prover suas necessidades básicas.
Quanto a previdência social, cabe ao Instituto Nacional do Seguro Social administrar o Regime Geral da Previdência Social, que tem a finalidade de seguro público, atuando por meio de contribuições dos segurados para quando necessitarem terem acesso aos benefícios previdenciários, como por exemplo, aposentadorias, pensão por morte, auxílio doença, salário maternidade e entre outros benefícios.
Frente a isso, denota-se que com a alteração da Lei n. 8.213/91 o Instituto Nacional do Seguro Social passou a ter legitimidade para ingressar com ações de regresso face aos agressores responsáveis pelo fato gerador para a concessão do benefício previdenciário, de forma que, houve decisões judiciais, inclusive do Superior Tribunal de Justiça, dando provimento as referidas ações.
Além disso, o Superior Tribunal de Justiça proferiu decisões concedendo auxílio doença às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar, razão em que a violência física e psíquica é equipara à uma enfermidade, determinando ao empregador o pagamento dos primeiros quinze dias de afastamento e o restante seja pago pelo Instituto Nacional do Seguro Social.
Diante disso, a presente pesquisa tem como objetivo analisar no âmbito previdenciário a percepção de auxílio doença às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar e a responsabilização civil dos agressores ante a legitimidade do Instituto Nacional do Seguro Social para requerer o ressarcimento dos benefícios concedidos, com o intuito de contribuir com a sociedade jurídica e efetivar os direitos das mulheres.
Em comparação com outras pesquisas publicadas no mesmo campo, denota-se que a tese abordada nesta pesquisa foi pouco discutida no âmbito jurídico, visto se tratar de matéria
previdenciária, cujo as decisões abordadas na pesquisa foram publicadas recentemente, o que enfatiza a importância da presente pesquisa para a comunidade científica e jurídica.
A presente pesquisa foi realizada mediante análise documental e bibliográfica em livros, revistas jurídicas, artigos, sites, jurisprudências e dados estatísticos, embasada profundamente, e superficialmente em alguns tópicos, em doutrinadores da seguridade social e do direito previdenciário.
2 DISCUSSÃO
A seguridade social surgiu na Idade Média por meio da assistência pública fundada na caridade, oferecida pelas entidades e organizações sociais privadas, como por exemplo, a Igreja, em que buscavam socorrer os necessitados. A primeira legislação acerca da assistência social surgiu na Inglaterra em 1601 com a chamada Lei dos Pobres, em que instituiu os socorros públicos, passando a responsabilidade ao Estado para promover e amparar os necessitados por meio de contribuição social. Com a Revolução Industrial do século XVIII, surge a necessidade de criar uma proteção aos trabalhadores, surgindo o direito previdenciário.
A constitucionalidade da seguridade social desponta na Constituição do México de 1917 e na Constituição de Weimar de 1919, transformando o Estado Liberal em Estado Social. Em 1942 é instituído o Plano Beveridge na Inglaterra, em que buscava atender todas as pessoas em estado de necessidade, estabelecendo a assistência e saúde, além da previdência (Garcia, 2023, p. 13).
No Brasil, a assistência pública foi prevista na Constituição do Império de 1824, em que garantia os socorros públicos para atender os necessitados. Em 1923 foi criada a Lei Eloy Chaves, considerada o marco da previdência no Brasil, pois instituía a Caixa de Aposentadorias e Pensões aos ferroviários, em que com o passar dos anos, foi estendendo-se para outras categorias profissionais até o que conhecemos hoje como previdência instituída pela Constituição Federal de 1988, em que visando a proteção social, instituiu a seguridade social, para assegurar os direitos à saúde, a previdência e a assistência social, conforme dispõe o art. 194.
A seguridade social abrange princípios específicos arrolados no artigo 194, parágrafo único, e artigo 195, §§ 5º e 6º, da Constituição Federal, bem como, alguns princípios gerais
como o princípio da legalidade, disposto no artigo 5º, inciso II, e o princípio do direito adquirido, disposto no artigo 5º, inciso XXXVI, ambos da Constituição Federal.
Quanto aos princípios específicos da seguridade social, podemos citar o princípio da universalidade da cobertura e do atendimento, disposto no artigo 194, parágrafo único, inciso I, da Constituição Federal, (Agostinho, 2020, p. 62-63) tem como objetivo prestar reparação e subsistência a todos os que necessitem, visando entregar ações, prestações e serviços de seguridade social, seja relativo à previdência social, seja nos casos de saúde e assistência social, cabendo a previdência a universalidade da cobertura, em razão da contribuição, e a saúde e assistência social a universalidade do atendimento, independentemente de pagamento ou contribuição.
O princípio da equidade na forma de participação no custeio, está previsto no artigo 194, parágrafo único, inciso V, e artigo 195, § 9°, ambos da Constituição Federal, em que a contribuição para a seguridade social se dará de forma equitativa, por meio de alíquotas diferenciadas de acordo com a capacidade contributiva de cada contribuinte, de forma que, (Garcia, 2023, p. 39) os que estão em condições econômicas e financeiras superiores devem contribuir em valores maiores do que aqueles que estão em condições econômicas e financeiras inferiores, mantendo o equilíbrio necessário ao ideal de justiça social.
O princípio da diversidade da base de financiamento, tem previsão no artigo 194, parágrafo único, inciso VI, e artigo 195, caput, ambos da Constituição Federal, em que prevê que a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, do empregador, empresa, entidade equiparada à empresa, trabalhador, outros segurados, administrador de concursos de prognóstico, importador de bens ou serviços do exterior, nos termos do artigo 195, incisos I a IV, da Constituição da Federal.
Entretanto, (Garcia, 2023, p. 39) quanto ao caráter contributivo da previdência social, o artigo 201 da Constituição da República dispõe que esta será organizada sob a forma de Regime Geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, devendo ser observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial.
O princípio da preexistência do custeio em relação ao benefício ou serviço, está disposto no artigo 195, § 5°, da Constituição Federal, em que, nenhum benefício ou serviço da seguridade social pode ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total, pois para isso, (Garcia, 2023, p. 41) deve haver a previsão da fonte de custeio total, ou seja, necessária para o financiamento completo dessa inovação.
Quanto aos princípios constitucionais, o princípio da legalidade está disposto no artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal, de modo que, ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, entretanto, no âmbito da seguridade social, este princípio é aplicado de forma que, a criação, modificação e aplicação da seguridade social, somente podem se dar mediante Lei.
Já o princípio do direito adquirido, está previsto no artigo 5°, inciso XXXVI, da Constituição Federal, bem como, no artigo 6°, § 2°, do Decreto-Lei 4.657/1942 (LINDB), em que, (Poletti, 2009, p. 46) o direito adquirido é aquele já incorporado ao patrimônio moral ou material de seus sujeitos, de forma definitiva, de maneira que não podem ser afastados por lei posterior.
As fontes de custeio da seguridade social estão dispostas no artigo 195, incisos I ao IV, da Constituição Federal e na Lei n° 8.212/1991, em que instituiu o Plano de Custeio da Seguridade Social e outras providências.
Quanto aos segurados, é obrigatório a sua contribuição para a previdência social, conforme dispõe o artigo 12 da Lei n° 8.212/1991, seja como empregado (inciso I), como empregado doméstico (inciso II), como contribuinte individual (inciso V), como trabalhador avulso (inciso VI), ou como segurado especial (inciso VII).
Além destas contribuições há outras contribuições sociais que não são objeto da presente pesquisa, que também, buscam financiar a seguridade social, observando o princípio da equidade na forma de participação no custeio, princípio da diversidade da base de financiamento e princípio da preexistência do custeio em relação ao benefício ou serviço.
A seguridade social é gênero cujo a previdência social é espécie, sendo composta a previdência pelo Regime Geral da Previdência Social, administrado pelo Ministério da Previdência Social e pelo Instituto Nacional do Seguro Social, Regime Próprio de Previdência Social, Regime Complementar de Previdência Social Pública e Regime Complementar de Previdência Privada.
Nas palavras de Gustavo Filipe Barbosa Garcia (Garcia, 2023, p. 190) “O objetivo do sistema previdenciário, assim, é cobrir as contingências sociais indicadas, entendidas como eventos ou situações que deixam os beneficiários (ou seja, segurados ou dependentes) sem condições de prover a subsistência, por meio da concessão, mediante contribuição, dos benefícios de auxílio-doença, aposentadoria por incapacidade permanente, aposentadoria por idade, aposentadoria por tempo de contribuição, aposentadoria especial, salário-família, auxílio-reclusão, pensão por morte.”.
A previdência social é organizada sob a forma de Regime Geral da Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, cujo a cobertura dos atendimentos encontra- se fixada no artigo 201 da Constituição Federal, dispondo o §2° do referido artigo, que nenhum benefício terá valor inferior ao salário mínimo.
O Decreto Nº 10.995, de 14 de março 2022, no anexo I, artigo 2°, dispõe que ao INSS compete operacionalizar o reconhecimento, manutenção e pagamento dos benefícios em geral, tendo como atribuições a manutenção do Regime Geral da Previdência Social, disposto no artigo 201 da Constituição Federal.
Os contribuintes da previdência são os sujeitos passivos devedores da contribuição previdenciária, e embora muitas vezes o contribuinte também seja segurado, há contribuintes que não são beneficiários, como por exemplos a empresa e o empregador doméstico.
Já os beneficiários englobam os segurados e dependentes, sempre pessoas físicas, podendo ser segurado obrigatório, em que englobam o empregado, o empregado doméstico, o trabalhador avulso, o contribuinte individual e o segurado especial, ou segurado facultativo, que são os demais que não estão incluídos no seguro obrigatório, como por exemplo o estagiário, desempregado ou dono(a) de casa.
Ademais, para fazer jus às prestações previdenciárias, é necessário que o segurado esteja recolhendo as contribuições devidas ao Regime Geral da Previdência Social, de forma a manter sua qualidade de segurado, bem como, tenha alcançado o período mínimo de carência para que possa gozar de um benefício, como por exemplo, o prazo de carência de doze contribuições mensais para a concessão de auxílio-doença. Além de outros requisitos específicos para a concessão de determinado benefício.
Além do mais, na perspectiva da violência doméstica e familiar, o Brasil passou a proteger com rigor os direitos da mulher vítima de violência doméstica quando Maria da Penha Maia Fernandes denunciou seu marido por ter tentado contra sua vida, deixando-a paraplégica. Entretanto, prolatada a sentença, foi interposto recurso que anulou o julgamento (Fernandes, 2012, p. 78-79).
Diante disso, em 2001, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos entendeu que a anulação do julgamento sem a punição do agressor feriria os direitos humanos, passando a responsabilizar o Brasil pelo ocorrido, fato que tomou proporção internacional (Fernandes, 2012, p. 80).
Dessa forma, o ordenamento jurídico brasileiro se viu obrigado a positivar uma Lei que garantisse os direitos das mulheres e sua proteção no âmbito das relações domésticas e familiares, tornando-se efetiva a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação contra as Mulheres e a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, cujo o Brasil havia aderido.
Diante desse cenário, foi positivada a Lei n° 11.340, de 7 de agosto de 2006, conhecida como Lei Maria da Penha, que tem como objetivo a criação de mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, bem como, reprimir a atuação dos agressores por meio de medidas protetivas de urgência e outros instrumentos assistenciais.
Entretanto, embora a Lei Maria da Penha seja uma grande conquista jurídica apara as mulheres, ainda há índices de agressões contra a mulher em esfera familiar. De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública (Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2019, p. 109), em 2018 houve, no Brasil, 263.067 casos registrados de lesão corporal dolosa decorrente da violência doméstica.
Ademais, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA, publicou no Atlas da Violência em 2019, que “houve um crescimento dos homicídios femininos no Brasil em 2017, com cerca de 13 assassinatos por dia. Ao todo, 4.936 mulheres foram mortas, o maior número registrado desde 2007” (IPEA, 2019, p. 35).
Dessa forma, torna-se evidente a necessidade de responsabilização civil do agressor com a reparação dos danos causados à vítima, além da responsabilização criminal, conforme se passará a expor.
A responsabilidade civil é um instituto legal e doutrinário que visa responsabilizar o causador de um dano ocorrido ilicitamente, seja este dano material ou moral, com o fim de reparar o bem jurídico, e na medida do possível, devolvê-lo no estado em que se encontrava.
Nas palavras de Maria Helena Diniz “Com base nessas considerações poder-se-á definir a responsabilidade civil como a aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda ou, ainda, de simples imposição legal” (Diniz, 2023, p. 20).
A responsabilidade civil está prevista no artigo 186 do Código Civil, em que dispõe que aquele que violar direito e causar dano a outrem, comete ato ilícito. No mesmo sentido prevê o artigo 927 do Código Civil, em que dispõe que aquele que, por ato ilícito causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Embora não haja unanimidade doutrinária em relação aos pressupostos para configurar a responsabilidade civil, prevalece o entendimento da existência de quatro pressupostos, quais sejam, conduta humana, culpa ou dolo, nexo causal e dano.
A conduta humana é configurada pela ação ou omissão que gerará a ilicitude e o correspondente dever de indenizar, respondendo, também, por danos causados que não foram decorrentes diretamente de sua conduta, como por exemplo, a responsabilidade por ato de terceiro e a responsabilidade por fato animal, dispostos no artigo 932 e 936 do Código Civil, respectivamente.
A culpa ou dolo, está relacionada com a conduta humana, sendo o dolo uma conduta positiva ou omissiva voluntária, realizada com o intuito de prejudicar outrem, conforme dispõe o artigo 186 do Código Civil, enquanto a culpa é caracterizada pela negligência, imprudência ou imperícia, praticada sem a intenção de violar o bem jurídico.
O nexo causal é um elemento imaterial que relaciona a conduta humana com o dano, de forma que a responsabilidade civil não pode existir sem a relação de causalidade. Na responsabilidade subjetiva o nexo causal é formado pela culpa e dolo, enquanto na responsabilidade objetiva o nexo causal é formado por previsão expressa legal ou pela atividade de risco, mesmo sem culpa do agente, conforme dispõe o artigo 927, parágrafo único, do Código Civil.
O dano pode ser material ou moral, sendo necessário a comprovação de que o dano foi causado com culpa ou dolo, bem como, comprovar o dano sofrido, sua espécie e valores, sendo indenizável quando preenchido os requisitos de diminuição ou destruição de um bem jurídico, certeza do dano, causalidade, podendo o dano ser direto ou indireto, subsistência do dano, legitimidade e ausência de causas excludentes de ilicitude.
Quanto ao dano patrimonial, Maria Helena Diniz conceitua “O dano patrimonial vem a ser a lesão concreta, que afeta um interesse relativo ao patrimônio da vítima, consistente na perda ou deterioração, total ou parcial, dos bens materiais que lhe pertencem, sendo suscetível de avaliação pecuniária e de indenização pelo responsável” (Diniz, 2023, p. 31).
Dessa forma, diferente do dano moral, o dano patrimonial visa o ressarcimento do patrimônio corpóreo da vítima, tendo valor exato do prejuízo, desde que comprovado o efetivo dano, com o intuito de ressarcir a parte o bem jurídico ao statu quo ante.
Além disso, dispõe o artigo 934 do Código Civil, que aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o que houver pago, constituindo o direito regressivo, in rem verso, a ser exercido contra o terceiro causador imediato do dano, pelo quanto por isso pagou. Para efetivar o direito de regresso, quando não há outra alternativa, é necessário ingressar com ação regressiva frente ao Poder Judiciário, em que, para o exercício do direito de ação, o artigo 17 do Código de Processo Civil instituiu as condições da ação, que são a
legitimidade e o interesse da parte postulante para ingressar em juízo.
Quanto ao interesse de agir, este surge da necessidade de obter por meio do processo a proteção ao interesse substancial, (Júnior, 2023, p. 194) de forma que se não for ajuizado processo, não será possível obter a tutela jurisdicional e a satisfação da pretensão.
Quanto a legitimidade das partes, nada mais é do que a titularidade ativa e passiva da ação, o artigo 18 do Código de Processo Civil, dispõe que ninguém pode pleitear direito alheio em nome próprio, (Gonçalves, 2023, p. 49) caso pudesse fazê-lo, obteria um provimento jurisdicional inútil, porque incapaz de repercutir na sua própria esfera jurídica.
Diante disso, sem as condições da ação o processo não tem existência e eficácia, tanto é verdade que o artigo 485, inciso VI do Código de Processo Civil, dispõe que o juiz não julgará o mérito da ação quando verificar ausência de legitimidade e interesse processual.
Em casos de exercício irregular ou ilícito de direito o artigo 120 da Lei n° 8.213/1991, permitiu o ajuizamento de ação regressiva interposta pela Previdência Social contra os responsáveis nos casos de “I – negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicadas para a proteção individual e coletiva; II – violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006”.
Além disso, dispõe o artigo 121 da Lei n° 8.213/1991, que o pagamento de prestações pela Previdência Social em decorrência dos casos previstos nos incisos I e II do caput do art. 120 da Lei n° 8.213/1991, não exclui a responsabilidade civil da empresa ou do responsável pela violência doméstica e familiar, pois a responsabilidade civil está prevista no artigo 186 do Código Civil.
Ainda dispõe a Súmula 188 do STF que o segurador tem ação regressiva contra o causador do dano pelo que efetivamente pagou até o limite previsto no contrato de seguro. Além disso, o artigo 934 do Código Civil prevê que quem ressarcir o dano causado por outro pode reaver o que houver pago daquele por quem pagou.
Nesse diapasão, a Segunda Turma do STJ julgou em 2017 o Recurso Especial Nº
1.431.150 – RS (2013/0388171-8) deferindo a possibilidade de o réu do crime de homicídio ressarcir ao INSS os valores pagos a título de pensão por morte aos dependentes da vítima. Da mesma forma julgou o TRF da 02ª Região a apelação cível nº 0121011- 08.2015.4.02.5002/ES, para condenar a empregadora a ressarcir o INSS os valores pagos aos dependentes do segurado empregado em razão da concessão do benefício de pensão por morte.
Na época do julgamento do Recurso Especial Nº 1.431.150 – RS (2013/0388171-8) os artigos 120 e 121 da Lei n. 8.213/1991 ainda não tinham sidos alterados pela Lei n° 13.846/2019, cujo o texto legal previa apenas a responsabilização do empregador nos casos de
negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva.
Desse modo, com a alteração da Lei n° 8.213/1991, em que passou a responsabilizar o agressor em ressarcir a Previdência Social nos casos de concessão de benefícios em razão de violência doméstica e familiar, o INSS passou a ter legitimidade para ajuizar ação regressiva contra o réu de crime de violência doméstica e familiar.
Em outra análise, a Sexta Turma do STJ julgou em 2019 o Recurso Especial nº 1.757.775 – SP (2018/0193975-8), em que concedeu o benefício previdenciário de auxílio doença para vítima de violência doméstica que precisem se ausentar do trabalho por segurança, determinando ao empregador o pagamento dos primeiros quinze dias de afastamento e o restante seja pago pelo INSS.
Dessa forma, o STJ interpretou a Lei Maria da Penha de uma forma extensiva, pois em razão da falta de previsão legal, equiparou a ofensa a honra da vítima com uma moléstia que garante o auxílio doença, como forma de evitar que as vítimas fiquem desamparadas.
Para garantir o acesso ao auxílio doença, é necessário que a segurada apresente a determinação judicial de afastamento do trabalho em decorrência de violência doméstica e familiar para comprovar que a ofendida está incapacitada a comparecer ao local de trabalho.
Judicialmente, a competência recai sobre a Vara Especializada de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, pois embora trate-se de afastamento do local de trabalho, a origem do afastamento se dá pela medida protetiva concedida pelo Juízo da Vara Especializada, nos termos do art. 14, da Lei n° 11.340/06.
Diante do exposto, conclui-se, que é dever do Estado assegurar a assistência jurídica “à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”, conforme dispõe o art. 226, §8°, da Constituição Federal.
Além disso, o art. 9°, §1°, inciso II, da Lei n° 11.340/06, assegura à mulher a manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho, confirmando a disposição do art. 6°, da Constituição Federal, que dispõe que “são direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados […]”.
Portanto, a percepção de auxílio doença às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar se faz necessário para garantir os direitos fundamentais registrados na Constituição Federal de 1988, bem como, garantir a proteção e segurança da mulher violentada.
Além disso, o princípio da universalidade defende que todos devem ter acesso a seguridade social, incluindo a previdência, o que evidência, mais uma vez, o direito de a mulher vítima de violência doméstica receber o auxílio doença, bastando ser preenchido os requisitos legais para a concessão do benefício.
Além do mais, embora a concessão de auxílio doença possa causar um déficit considerável no erário, o INSS tem legitimidade para ingressar com ação de regresso em face do agressor a fim de responsabilizá-lo a restituir os valores despendidos com a concessão do benefício, conforme dispõe o art. 120, inciso II, da Lei n. 8.213/91.
Por fim, a concessão de auxílio doença para as vítimas de violência doméstica e familiar é um grande amparo e uma grande conquista para as mulheres, pois o ordenamento jurídico passou a reconhecer a ofensa à integridade física ou psicológica da mulher como uma enfermidade, garantindo os direitos e a efetividade da proteção da mulher.
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